
“O idoso pode desempenhar um papel na sociedade. Se é verdade que o homem vive da herança de quem o precedeu e o seu futuro depende, de modo determinante, da forma como são transmitidos os valores da cultura do povo a que pertence, a sabedoria e a experiência dos anciãos podem iluminar o seu caminho pela via do progresso, rumo a uma forma de civilização cada vez mais completa.”
João Paulo II
A Casa de Repouso João Inácio de Sousa é uma instituição de solidariedade social no concelho das Velas já com 111 anos de existência, tendo sido fundada a 21 de maio de 1903.
O Senhor José está na Casa de Repouso há dois anos juntamente com a sua esposa. Faz a “diligência de gostar”, mas sente-se bem, ocupa o seu dia e é bem tratado.
“Fez no dia cinco de novembro dois anos que cheguei aqui mais a minha esposa. Faço a diligência de gostar, mas a verdade é que eu não vim para aqui por gosto”, contou José Enes, que é natural de Santo António, Freguesia do Norte Grande.
O que realmente aconteceu foi uma daquelas infelicidades da vida que nos privam de certas coisas e nos impossibilitam de continuar o nosso caminho com a maior “independência” que queremos e gostamos. A mulher do Senhor José, como é carinhosamente tratado no lar, adoeceu, teve um AVC que lhe paralisou os movimentos do lado direito do corpo.
“A minha mulher não dava um passo, temos três filhos mas nenhum deles tinha condições de tratar dela”, explicou o Senhor José. Passado um mês da sua esposa ter estado internada no Centro de Saúde vieram para a Casa de Repouso, tendo já passado dois anos.
“Até aqui não tenho queixa nenhuma a fazer de ninguém, nem dos funcionários nem das outras pessoas que cá estão como eu”, contou.
O Senhor José ocupa o seu dia a fazer as suas caminhadas, a jogar às cartas e a conversar no Centro de Dia e a fazer trabalhos em artesanatos, “uma espécie de cesto que antigamente havia muito, os balaios”, como disse o próprio.
“O meu pai era camponês, tinha vacas, pastos, terras. Nasci no campo e andei descalço até aos 20 anos, não por o meu pai não ter nada, porque eramos pessoas remediadas, mas porque naquele tempo era assim”, relatou quando falava um pouco sobre a sua história de vida.
“Eu tentei adaptar-me o melhor possível”, dizia no fim da conversa o Senhor José ao referir-se à Casa de Repouso e a esta nova forma de vida que encontrou ao mudar-se para o lar há dois anos com a sua esposa.
A Casa de Repouso – funcionários e promoção do bem-estar
Um lar que acolhe de momento 73 idosos, com o trabalho e dedicação diária de 60 funcionários. Uma casa que, de acordo com o seu presidente, Paulo Silveira, reúne as condições necessárias para o conforto e bem-estar dos seus utentes.
“Destes 73 idosos apenas oito são independentes, os outros são todos pessoas com dependência moderada ou total”, explicou o presidente, ressalvando ainda a lista de espera que conta com 15 pessoas à espera de vaga para entrar na Casa de Repouso João Inácio de Sousa.
No que respeita aos funcionários, Paulo Silveira, afirma que normalmente as pessoas consideram que 60 funcionários é um número exagerado, no entanto, não têm talvez a noção dos cuidados que cada utente exige, principalmente quando se tem um número tão elevado de idosos dependentes.
“São 24 horas por dia durante 365 dias e recorde-se que os funcionários estão distribuídos por várias valências, nomeadamente na cozinha, refeitório, domicílio, na parte da saúde, manutenção, na secretaria”.
Todos estes funcionários servem para dar “o maior conforto possível aos utentes” salienta Paulo Silveira. Bruna Sousa, terapeuta ocupacional na Casa de Repouso, também partilha da mesma opinião.
“Temos 23 idosos dependentes de cadeira de rodas e claro que é muito mais difícil organizarmos o serviço, porque precisam de apoio para ir à casa de banho, para a higiene, para a alimentação e claro que o esforço por parte dos funcionários tem que ser muito maior”, sendo que de acordo com a terapeuta “no geral corre tudo muito bem e que são asseguradas as condições mínimas para o conforto e bem-estar dos nossos idosos”.
Quanto à gestão, a Casa de Repouso está a ser gerida “de forma a que não haja ruturas”, adianta o presidente. Para Paulo Silveira todas as instituições passam por dificuldades e a Casa de Repouso João Inácio de Sousa não é exceção, mas facto é que dessas dificuldades não advém “menos empenho e menos dedicação”.
“Apesar das dificuldades, tudo se mantém, as pessoas estão a ser bem atendidas e, felizmente, nada tem faltado aos utentes desta casa”, rematou Paulo Silveira.
A nível de sobrevivência do próprio lar, a Casa de Repouso conta com 80% das pensões de cada idoso, algo que na opinião do presidente não chega por vezes nem para metade das despesas, e conta ainda com a compensação da Secretaria Regional da Solidariedade Social.
E é também já no dia 31 de Março do próximo ano que deverá ser inaugurado a mais recente obra da Casa de Repouso João Inácio de Sousa que consiste num novo Centro de Dia. “Estamos em fase de construção de um Centro de Dia, que é apoiado pelo programa PRORURAL, eixo 3, da ADELIAÇOR”, frisou o presidente da Casa de Repouso.
Recorde-se que esta direção da Casa de Repouso João Inácio de Sousa é mais ou menos recente, não tendo completado um ano de mandato, mas rege-se pelos mesmos valores desde a altura da tomada de posse enunciados por Paulo Silveira: “Rigor, exigência e transparência”, acrescentando ainda que o lar está sempre aberto para quem o quiser visitar e que a direção se mantém sempre disponível para qualquer tipo de esclarecimentos.
As atividades e a importância de uma segunda família
Para além de Terapeuta Ocupacional na Casa de Repouso, Bruna Sousa é também Coordenadora de Atividades e falou à RL Açores sobre as atividades realizadas na Casa de Repouso, revelando que normalmente é feito um plano semanal e neste plano é tido em conta a definição de “atividades de estimulação cognitiva e de estimulação física de modo a prevenir futuras incapacidades inerentes do próprio processo de envelhecimento”.
De acordo com Bruna Sousa são várias as atividades realizadas ao longo do ano, tendo em conta as épocas festivas e contando com duas animadoras socioculturais.
Pintura, jogos, ginástica geriátrica, jogos de estimulação cognitiva, atividade física, bingo são algumas das atividades promovidas para os idosos.
“No geral eles demonstram-se entusiasmados, mas também há ainda o estigma de ‘não querer fazer nada’ e ficam muito tempo parados e não os incentivarmos eles preferem estar sem fazer nada” revelou Bruna Sousa no que respeita as atividades, acrescentando que por vezes é difícil “tentar levantá-los do sofá, mas que já vão aderindo mais”.
“Somos talvez a segunda família e é claro que é difícil e muitas das vezes, mesmo sem querer, apegamo-nos a alguns idosos e é nossa função dar um bocadinho de carinho e atenção para que possa ter melhor qualidade de vida nesta fase”, revelou.
Numa altura em que se aproxima a época de Natal, Bruna Sousa conta que tentam fazer algo alusivo à época, sendo feita a ceia da Natal, “um pouco mais cedo do que o habitual”, mas facto é que a data não passa em branco e é lembrada junto daqueles que já passaram tantos “natais” em família e agora devido a circunstâncias da vida podem estar um pouco mais sozinhos.
Liliana Andrade/RL Açores