Crónica de Opinião – 22 de novembro de 2013

As Palavras do João – Ó chicharro fresco

açores_radio_lumena_noticias_turismo_ilha_cronica_João_Gago_CâmaraÓ chicharro fresco! Lembro-me deste apregoar quase em cantoria dos vendilhões a pé descalço transportando às costas o varapau com os cestos do chicharro que vendiam pelas portas dos povoados. Vinham de noite das lotas da ilha andarilhando por montes e vales para de manhã venderem o pequeno peixe tido como o pão dos pobres. O conhecido Manuel Favica botava-se a pé do norte, vendia o peixe na cidade e, após a venda por uma bela pechincha, regressava a pé à freguesia para ainda deitar a mão à enxada e ir cavar as terras dos senhores.

Vem-me isto à ideia quando ouço nas notícias que em Portugal toneladas de peixe vão todos os dias para o lixo, sendo, deste modo, destruída grande quantidade de chicharro, isto porque os pescadores não conseguem escoar o peixe, cujo preço, dada a quantidade de pescado, não pára de baixar nas lotas portuguesas.

“A culpa é dos intermediários e dos retalhistas”, dizia o mestre da “Pérola de Sesimbra”, traineira que acabara de acostar. “Somos ricos a apanhar e pobres a vender porque estamos sempre dependentes dos compradores” – referia outro mestre ajudado por dois filhos, ambos arquitetos, cuja vida no estirador já era. Na lota, entre os intermediários, fica com o lote quem primeiro carrega no botão do comando, mas o passar a amarelo da bola verde no ecrã das compras significa que o valor desceu tanto que o armador já não vende e que o peixe vai todo para o lixo. Tolera-se isto num país onde a fome já é uma constante? Onde instituições de solidariedade social, inclusivamente asilos de idosos e casas abrigo para jovens desvalidos vivem sobretudo da subsidiação e da caridade? Porque razão, nestes casos de baixa do valor do pescado, os particulares não têm acesso à lota, sendo dada essa permissão exclusivamente aos senhores intermediários que acabam por não comprar sabendo de antemão que o destino do pescado é o caixote de lixo?

Mas, meus amigos, já nada é de estranhar num país (des)governado diariamente por um rapazolas que só faz asneiras. Um país onde há um economista e professor universitário, César das Neves, que diz que a maior parte dos pensionistas não são pobres, fingem que o são… Esses que sabemos todos os dias terem que escolher entre a comida e os medicamentos. Fingir que se é pobre, outra novidade! Se tivesse um dia que fingir de alguma coisa na minha vida, de certeza que não seria de pobre!. Acho que vou fingir é que este gajo não existe, e os outros também.

João Gago da Câmara